sexta-feira, 27 de março de 2009
Eu, Michel Mouton
Recordo os meus tempos de aprendiz de condutora. Eu que achava que nunca conseguiria conduzir um carro, que tinha pesadelos horrendos em que me via dentro de um, sem saber o que fazer e o dito a ir ravina abaixo. A muito custo lá me rendi à “necessidade” e à “autonomia” e ao “tem que ser” para conhecer uma das personalidades mais marcantes da minha vida: o Sr. Machado. Ora, vamos lá ver, o Sr. Machado era um belo sexagenário, todo gingão, cabelo branco puxadinho para trás, pólo Lacoste e sapatinho de vela, elegante, bem-falante e exímio assobiador. Esta semana ia a passar pelo centro da cidade, a apreciar o mulherio todo descascado com os leves raios de sol que despontaram e relembrei o meu caro instrutor. “Olha, olha, já viste aquela? Abranda lá… Epá ainda rompe meias solas! Isto de ver as mulheres entradotas a vestir como as de vinte é do melhor!”, era o delírio. Eu que estava mais preocupada em não arrancar espelhos aos carros estacionados e a largar a embraiagem devagarinho, conseguia lá reparar nas gajas que o Sr. Machado galava…! Quando vinham as bocas aos “pretos” é que me dava a alergia total… “Isto de dar aulas de condução aos pretos é que é demais, cheiram mal pá, não percebem nada disto, é que não têm mesmo jeito nenhum, não é como tu assim jeitosinha” e pronto estava dado o ponto de partida para uma série de divagações de supremo interesse sociológico. Era assim o Sr. Machado, um malandreco, com pouca paciência para a minha fraca destreza nos estacionamentos, mas que cedo percebeu os meus dotes e me aconselhou a fazer o exame pelo privado que era mais… “seguro”. Um pedagogo, portanto.
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