Sábado de manhã. Só eu e o Nove e meia no Maria Matos a tocar sob a luz clara do sol que entra pelas janelas. Visto as calças largas, a camisa de menina de colégio, a camisola e o casaco, ponho os ténis. Sinto o corpo leve. Há algum tempo que não me lembro de sentir esta leveza. Tenho pressa, quero ir sentir o sol a bater-me na cara enquanto leio o jornal entre dois tragos de café. Toca o telefone: é o viajante. Demoro-me mais do que esperava, mais do que foi habitual durante os últimos anos. Sento-me à beira da cama. Começo por responder com monossílabos às perguntas. Vou-me deixando ir e passam 15 minutos: um record para conversas com o viajante. Das últimas vezes que temos conversado tem-me perguntado como estou, voltou a fazer a mesma pergunta. Não entro em pormenores, conto-lhe rapidamente e mais rapidamente ainda mudo de assunto. Dou por mim a pensar no que hei-de dizer mais para a conversa não acabar. Ah, música, claro: - O que queres que te mande desta vez?, - Oh, o que quiseres, escolhe tu. Rimo-nos um bocado, ultimamente consigo rir-me com as piadas dele. Mas... Já chega de conversa viajante! [Então, não perguntas mais nada? Não tens mais novidades?] Vá, vá, para a semana conversamos [Só vais voltar a telefonar daqui a uma semana? Não achas que é tempo demais?]. Beijinhos e abraços. Manda beijos aí em casa. Diz-lhe que lhe ligo amanhã. Desligo o telefone. Avanço ligeira para a porta como se realmente estivesse cheia de pressa. Páro-me ainda antes de sair, surpreendo-me: será que fiz mesmo as pazes com ele? Parece que sim. Sorrio. Torno o passo mais firme. Sinto-me ainda mais leve.
[Banda sonora: O Primeiro Dia, Sérgio Godinho, versão do último álbum]
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