Badalava o sino, tinha início a cerimónia. Comemorava-se a confirmação do espírito santo nas vidas dos crismandos entre música, salvas de palmas, pilares frios, bancos duros, choros de crianças, tosses de velhos e discursos enfadonhos. Leve, fofa e mal dormida debatia-me com divagações pecaminosas enquanto bispos e sacerdotes acenavam airosamente por atenção, pregando a alegria da vida em Cristo. Por mais que me concentrasse em tais desígnios, senhora dona minha mente voltava a despegar-se em fantasias ardentes, loucas de “ses” depois deste estado… líquido, em que me deixaste. De facto, a vida espiritual tem o seu encanto e não há dúvida que a religião acarreta certos princípios sobre os quais muito reflecti e cresci. Mas não havia meio da espiritualidade da pele das tuas costas que me ferviam ao toque, me sair da cabeça. Filosofei sobre os amassos, os lábios, os suspiros e as palavras abrasivas, mas era aquela pele, que apenas senti por segundos, que me fazia rodopiar entre as gravuras na parede, as imagens dos santos, o vinho e as hóstias e os sinos que continuavam a tilintar nos meus ouvidos. As mais esganiçadas das vozes bramiam “O senhor está em mim, a jorrar dentro de mim”, o meu corpo manifestava-se e ecoava o décimo mandamento subvertido após infinitas tentativas infrutíferas de te manter longe. Parece que há espíritos que se elevam quando se encontram num mesmo plano mediúnico. E que brincam e se enlaçam e se deslumbram numa química não científica.
No final, uma única certeza: não há salvação possível para esta alma impura.
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2 comentários:
Lira, ainda nao te disse e impoe-se que o diga: gosto da feminilidade assanhada e animal dos teus escritos. De cada vez, és tu a meter uma mao pelas entranhas e a puxá-los cá para fora a sangue frio. Cada um é parido dolorosamente e logo amado, mesmo com os restos do parto, sem ser limpo, mesmo tu ainda convalesncente... Muito bom!
leo
Minha querida leo é nestes momentos que a dor de os parir se confunde com prazer!
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